Simplesmente porque sempre achei que visitaria Dublin no âmbito de uma roadtrip que também incluísse, o que imagino ser, um dos mais maravilhosos countrysides da Europa e não apenas numa escapadela de cidade.
Mas a Guinness não é uma cerveja qualquer e o simples acto de servir uma pint é algo levado muito a sério na Irlanda.
Absolutamente imperdível é a visita à Guinness Storehouse, na mítica St James’s Gate Brewery desde 1759.
Numa fenomenal exposição multimédia distribuída por vários andares de um edifício inteiro, aprendemos sobre a incrível história de sucesso da marca, sobre a técnica do “surge and settle” que é característica desta cerveja, que com muita qualidade, mística e associada a poderosas campanhas de marketing, transformaram a Guinness numa love brand irlandesa.
Gostei de sentir aquele espírito académico centenário, mas o meu local preferido foi a Long Room da biblioteca antiga, uma das bibliotecas mais bonitas que já vi, com um sem número de prateleiras de madeira que parecem não ter fim, onde o cheiro dos livros antigos inunda o ar.
Aqui também podemos ver o Book of Kells, um dos maiores tesouros da Irlanda, um antigo manuscrito dos evangelhos cheio de iluminuras ainda muito bem conservadas, que os monges Celtas decoraram no sec IX, na ilha escocesa de Iona, e depois enterraram no chão para o protegerem das incursões Vikings.
Dublin tem um castelo mas não é propriamente um castelo tradicional com muralha defensiva, torre de menagem e ponte levadiça. É mais como um palácio do séc XVIII cujo único elemento sobrevivente da época medieval é um torreão solitário, a Record Tower.
Junto ao castelo estão os jardins de Dubh Linn (Lago Escuro) onde se situava o lago que deu o nome à cidade e é um local bem agradável para um passeio num dia cinzento.
Seria muito difícil passar por Dublin e não entrar em nenhum pub, ou vários. Dublin tem mais de mil pubs de todos os tipos mas, quanto a mim, os melhores são aqueles mais tradicionais com decoração em madeira e sofás de pele antiga. Alguns são verdadeiras instituições com centenas de anos, onde as pessoas vêm descontrair depois de um dia de trabalho e onde somos sempre recebidos com sorrisos.
Em muitos pubsé possível comer, para além de beber, e quase todos têm música ao vivo, uma das melhores coisas de visitar Dublin.
Deixo aqui os pubs que mais gostei:
- L Mulligan Grocer, uma antiga mercearia;
- O’Briens, um dos mais tradicionais de Dublin;
- The Bleeding Horse;
- The Brazen Head, em funcionamento desde 1198.
Ao longo do séc XVIII Dublin tornou-se uma das cidades mais prósperas do império britânico. Entre os reinados dos reis George I e George IV, que se designou por período Georgiano, a cidade começou a crescer para fora da malha medieval e adoptou as directrizes arquitectónicas simples e elegantes que chegavam de Londres.
É verdade que nesta traça simples e elegante, os edifícios pecam um pouco por falta de originalidade, por isso para romper com as estritas regras, os moradores tomaram a iniciativa de imprimir o seu cunho pessoal pintando as portas em tons garridos.
Muitos dos museus de Dublin são grátis, principalmente as galerias que pertecem ao National Museum of Ireland. Visitámos o de Arqueologia e o de História Natural.
O museu de História Natural também parece que parou no séc XIX quando foi inaugurado pelo explorador escocês David Livingstone. Podemos explorar a colecção vastíssima de animais embalsamados mas o que mais gostei foi do ambiente victoriano meio empoeirado que deve ser bem representativo desses tempos.
Com tantas pints de Guinness a serem servidas por minuto na cidade, o culto do café não é a primeira coisa que se associa a Dublin, mas é incrível a quantidade de cafézinhos que existem na cidade cada um mais expert em blends do que o outro e todos muitíssimo acolhedores.
Não existem grandes esplanadas mas estes cafés tiram partido das montras e janelas típicas da arquitectura local, de modo que existe sempre um balcão virado para a rua para nos sentarmos e ficarmos a ver passar.
O slogan de uma das peixarias do porto de Howth é “if it swims, we have it”. Isso caracteriza muito bem a diversidade marinha existente nestes mares, uma das grandes atracções deste local, com inúmeros restaurantes de peixe e marisco e toda a actividade portuária que nos é tão querida e familiar.
Adorei ficar sentada no pontão a observar a ida e vinda de barcos, os pescadores na sua lida, as gaivotas em vôo rasante e os leões marinhos que se iam aproximando dos barcos em busca de algum peixinho grátis.
Eu lembro-me de usar umas camisolas horrorosas mas ultra-quentinhas nos meus invernos nos anos 80. Às vezes ainda as uso no Natal porque a casa é fria e são praticamente as únicas peças de roupa da minha infância que a minha mãe foi proibida de dar.
Pois, volvidas 3 décadas, verifiquei que essas camisolas são um fenómeno de popularidade na Irlanda durante a época natalícia. As ruas de Dublin no início de Dezembro estavam totalmente “infestadas” de Ugly Christmas Sweaters e vimos grupos inteiros de todo o tipo de pessoas e de todas as idades a envergar orgulhosamente as suas camisolas com renas dançantes, árvores de natal a piscar e pais natais entusiasmados.
Dublin
Descobri uma cidade despretensiosa, modesta, simples e natural que não padece de sentimentos de grandeza nem tem nada a provar. Isso foi uma das coisas que mais gostei na cidade. Ficámos apaixonados pela simpatia dos irlandeses, como nos acolheram com boa disposição e nos fizeram sentir em casa.
Agora, depois de voltar, dou por mim a re-descobrir os irish pubs de Lisboa e a espreitar as prateleiras das cervejas internacionais nos supermercados à procura de uma Guinness original.